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Seu cônjuge é seu herdeiro — mesmo no regime de separação total de bens. Mas decisões recentes têm validado a renúncia recíproca desse direito em pactos antenupciais.

Muita gente se surpreende com isso: mesmo que o casal tenha optado pela separação total de bens, o cônjuge sobrevivente ainda tem direito de herdar — concorrendo com os filhos, por exemplo.

Essa regra costuma gerar conflitos sucessórios, principalmente em casamentos ou uniões estáveis formadas mais tarde, quando já existem filhos de relações anteriores. Nesses casos, o novo companheiro pode disputar a herança com os descendentes, ainda que o patrimônio tenha sido construído antes da nova união.

Tendo em vista essa realidade complexa O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul reconheceu recentemente a validade de uma cláusula em pacto antenupcial na qual os cônjuges renunciaram reciprocamente ao direito de herdar um do outro. Em outras palavras, cada um abriu mão de concorrer na sucessão com os filhos do outro.

A decisão é importante porque mostra que os tribunais começam a aceitar esse tipo de ajuste, desde que feito de forma clara, voluntária e sem contraprestação (ou seja, sem parecer uma “compra” de herança futura).

O que decidiu o Tribunal?

O TJMS entendeu que:

  • O pacto antenupcial não é um contrato de herança de pessoa viva. A proibição do art. 426 do Código Civil impede a negociação da herança futura, mas não veda a definição prévia do direito concorrencial entre cônjuges.
  • No caso analisado, a cláusula afastava apenas a concorrência com descendentes ou ascendentes — uma posição eventual e condicionada — sem retirar a qualidade sucessória do cônjuge em outras hipóteses.
  • O Tribunal baseou sua decisão na autonomia privada, boa-fé objetiva e vedação ao comportamento contraditório, citando precedentes de outros tribunais que seguiram o mesmo entendimento.

O que você pode fazer?

Se o objetivo é evitar conflitos sucessórios e garantir clareza sobre quem herdará o quê, vale avaliar com seu advogado:

  • A possibilidade de incluir cláusulas de renúncia sucessória no pacto antenupcial ou contrato de convivência;
  • A compatibilidade dessas cláusulas com o regime de bens e eventuais testamentos;
  • A forma correta de formalizar o acordo, com escritura pública e plena consciência das partes.

Pontos de atenção antes de incluir a cláusula de renúncia

Apesar da boa notícia, é essencial adotar cautela ao incluir esse tipo de cláusula.
Veja alguns cuidados importantes:

  1. Redação da cláusula – Quanto mais o texto se aproximar de uma transferência de herança ou envolver contraprestação, maior o risco de nulidade. O STJ já anulou pactos que, na prática, configuravam negociação da herança futura.
  2. Formalidade e reciprocidade – Cláusulas recíprocas, claras e lavradas por escritura pública, sem qualquer compensação financeira, tendem a ser mais bem aceitas (como no caso julgado pelo TJMS).
  3. Prova da vontade livre – É importante documentar a plena capacidade das partes, ausência de coação e compreensão dos efeitos do pacto.
  4. Compatibilidade com testamento e regime de bens – Avaliar o impacto da cláusula sobre a meação e sobre eventuais disposições testamentárias evita conflitos entre os instrumentos.

O que fazer agora?

A decisão do TJMS não elimina os riscos de impugnação, mas abre caminho para planejamentos mais flexíveis e adequados à realidade das famílias modernas, especialmente em segundas uniões.

Se o objetivo é prevenir disputas sucessórias e garantir clareza na sucessão patrimonial, considere:

  • Revisar pactos antenupciais e testamentos já existentes;
  • Reformular cláusulas para deixar clara a renúncia apenas ao direito concorrencial, evitando termos como “cedo quinhão” ou “transfiro herança”;
  • Formalizar adequadamente o pacto, com escritura pública e orientação jurídica especializada;
  • Registrar documentação que comprove a vontade livre e informada dos nubentes ou conviventes.

Beck Advogados Associados

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